quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Os desabafos de um pensante-dançante ou dançante pensante

 Hoje só quero desabafar.
Compartilhar com o mundo os fragmentos da minha dor,
as alegrias das descobertas
e a angústia do indeterminado: não saber como agir, o que seguir, quando partir e o porquê de sentir tanto.

Vivo a fase Dom Quixote de um ser a muito inadequado.
 O que é ser adequado?
 É se enquadrar nas regras preestabelecidas para a convivência em certa sociedade? É representar o papel social ao qual você se destina como mulher, como mãe, como professora, como bailarina? É ouvir mais do que falar? É conseguir falar mais do que ouvir? É ter o poder social? É ter o poder da situação? É dominar os outros? É ser dominado pelos outros? É ser obediente? É ser teimoso? É ser humilde? É ser impositivo? É ser isto ou aquilo? É ser isto e aquilo?
  Lembrei-me da música "Dom de iludir" do Caetano, especificamente do trecho cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é...
  Dói ser Eu Mesma - myself - sentir o mundo tão profundamente! Cada experiência, uma grande emoção. Ver o mundo com olhos sensíveis, na beira do pranto... Pronto para expressar a intensidade de cada momento. Ir fundo, no fundo, no fundo do poço? Que poço é esse e que água ele reserva? O poço do sentir, da intensidade da sensibilidade, do querer e gostar de sofrer para aprender, para crescer, para melhorar. O poço do pranto, com as lágrimas da minha alma que sente profundamente o mundo em cada respiração, e em cada ação.
  Para Pessoa, o poeta é um fingidor. Finge tão completamente que chega a sentir que é dor, a dor que deveras sente... Eu sou um sentidor. Sinto tão completamente que chego a sentir que é dor, a dor que deveras sinto... Sinto deveras... Devo sentir? Não devo nada a ninguém; só sinto completamente. Sou condenada à sensibilidade e não à liberdade, como disse Sartre.

DOM DE ILUDIR (Caetano Veloso)

Não me venha falar
Na malícia de toda mulher
Cada um sabe a dor
E a delícia
De ser o que é...


Não me olhe
Como se a polícia
Andasse atrás de mim
Cale a bôca
E não cale na bôca
Notícia ruim...


Você sabe explicar
Você sabe
entender tudo bem
Você está
Você é
Você faz
Você quer
Você tem...

Você diz a verdade
A verdade é o seu dom
De iludir
Como pode querer
Que a mulher
Vá viver sem mentir...

AUTOPSICOGRAFIA (Fernando Pessoa)

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
                   _____

Não tenho ambições nem desejos.
ser poeta não é uma ambição minha.
É a minha maneira de estar sózinho.
               _________

POEMA EM LINHA RETA
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedindo emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
                                                                        Poema extraído do livro "O EU PROFUNDO E OS OUTROS EUS", Fernando Pessoa, antologia poética, editora Nova Fronteira)


         Sou racional pelo meu corpo. Não consigo mais pensar sem sentir nem sentir sem pensar!
  A angústia é um pensamento ou um sentimento?
  Reverbera em meu corpo os pensamentos angustiados, que tomam conta de mim. Também o tremor do meu corpo angustiado me faz pensar no porquê de cada ato, de cada desejo, de cada escolha (mesmo que seja um questionamento que não encontre nenhuma resposta).
  E novamente Caetano entoa meus pensamentos... Lembrei-me da música:

DESDE QUE O SAMBA É SAMBA (Caetano Veloso)

A tristeza é senhora
Desde que o samba é samba é assim
A lágrima clara sobre a pele escura
A noite, a chuva que cai lá fora

Solidão apavora
Tudo demorando em ser tão ruim
Mas alguma coisa acontece
No quando agora em mim
Cantando eu mando a tristeza embora

A tristeza é senhora
Desde que o samba é samba é assim
A lágrima clara sobre a pele escura
A noite e a chuva que cai lá fora

Solidão apavora
Tudo demorando em ser tão ruim
Mas alguma coisa acontece
No quando agora em mim
Cantando eu mando a tristeza embora

O samba ainda vai nascer
O samba ainda não chegou
O samba não vai morrer
Veja o dia ainda não raiou
O samba é o pai do prazer
O samba é o filho da dor
O grande poder transformador




     Não sei se preciso que concordem e/ou que discordem de mim; que me ignorem e/ou que me mimem, fazendo me importante em seus mundos.
     Só sei, nesse instante, que quero compartilhar as fragilidades da minha alma. Preciso expor a minha humanidade transbordante...


MAS CONFESSO QUE GOSTARIA  QUE COMPARTILHASSEM COMIGO AS SUAS FRAGILIDADES; SE AS TIVER, CLARO.

5 comentários:

  1. Estou novamente presente aqui...
    Nem consegui ler tudo, mas só de ver um dos versos do grande Pessoa, que simplesmente me trasnscreve, já me empolguei! Não tenho ambições faraonicas, não tenho projetos mirabolantes, mas tenho um mundo construído em mim, habitado por mim, continente de nuances que variam desde a angústia à alegria... como soa estranho aos nossos ouvidos um pedido como esse, feito acima, "compartilhar as nossas fragilidades...". soa estranho por que já nos acostumamos com nosso estado de pseudo super herói, ou seja, somos fortes, temos que ser fortes, temos que maquiar nossas fragilidades, acabamos que tentamos extinguir nossas fragilidades, e só nos encontramos com elas à sós... Minhas fragilidaes são tantas... assim como meus medos... "Ser poeta não é uma ambição minha, é a minha maneira de estar sozinho", sim, tenho a poesia como a lei do meu interior... é ela a minha linguagem mais humana, mais íntima, talvez a que mais fale de mim. quando escrevo, pretendo fugir, pretendo ter nos meus poemas o ponto de fuga, de abrigo, de repouso... o lugar das lágrimas, dos risos sem motivos... sim, quando escrevo me transporto pra dentro de mim mesma, deixo fluir e deixo à mostra as fragilidades que cotidianamente tento esconder. "Ser poetisa é a realidade transcrita em mágica"...

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  2. Cara Claudinha, penso que ser ou estar frágil não é ser fraco, mas é ter a coragem de reconhecer-se totalmente humano. Por isso, encaro minhas fragilidades sob o ponto de vista de Nietzsche, ou seja, como possibiliades de me potencializar, superando e compreendendo o sofrimento, para retornar ao mundo e a mim mais forte. Beijos, Dili.

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  3. Reconhecer-se totalmente humano. Essa é, para mim pelo menos, uma fragilidade sem tamanho, porque ser humano de fato, requer da gente algo a mais, requer que existamos de fato, e que pensemos, mas principalmente, que possamos de fato sentir. E o que seria esse sentir de fato? Não sei dizer, pois ainda me pego as vezes procurando por ai o que seria isso, pensando sobre meus sentimentos tão profundamente que chego a ir em um lugar de mim que eu mesma desconheço, e nem sei definir.

    Putz ser humano é de fato uma fragilidade pra mim, não só porque é extremamente difícil, e muitas vezes doloroso, e cansativo, mas por em alguns momentos acreditar que isso me seja prejudicial. Mas existem outros momentos que acredito que isso é o que faz de mim uma pessoa feliz, se importar de fato com certas coisas, parar para poder pensar, mesmo que seja em nada. E também acho que isso seja uma raridade, pois o que vemos são seres máquinas, e não seres humanos.

    Creio que ainda não conheço minhas outras fragilidades, pois esta é a que me expõe mais diante dos outros, é a que mais me machuca, porém a que de fato mais me alegra.

    Confesso que as vezes queria ser menos normal (no sentido normal da Rochelle rsrs), e que queria poder não ser, o suficiente, para poder não sentir, não pensar, não olhar, analisar, não sentir pena, não estar de fato no mundo, não ser um alvo tão fácil de se atingir.

    Amanhã ou depois, vou conseguir deixar de ser humana, mas também, tanto faz se depois for nunca mais.

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  4. É possível deixar de ser humano?

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  5. Vamos lá... rsrs
    Não sei, as vezes também me pergunto isso sabe, SER HUMANO, com todas as características que temos é difícil, ser racional, pensante, lógico, sonhador, viajante, e tantas outras qualidades e defeitos que temos. Mas penso que muitas pessoas se deixam dominar, não sei ainda exatamente pelo que, mas as vezes noto que algumas, e pelo que vejo a grande maioria, age tão friamente, não se preocupa, está preso, creio eu, em algum tipo de prisão, que não sei qual, que as deixa como "seres máquinas", como robôs, não penso com a profundidade que deveria, não me preocupo com o todo, não falo e me manifesto quando devo, apenas deixo a vida passar, sem de fato existir, de fato estar presente e profundamente sensível as coisas que acontecem, essa seria para mim, uma maneira de deixar de ser humano, não no sentido espécie da palavra, mas creio eu, que no sentido mais existencialista.

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